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O "rolezinho do shopping" e o "bolero de ravel" da guerra social‏

/ DIVERSOS

Prezados,

 

Pensem nisso, por favor.

 

O jornal de domingo último traz o depoimento de vários representantes da "franquia campograndense", do tal "rolezinho", discorrendo sobre a importância de jovens pobres se aglomerarem nos shoppings brasileiros, já que não dispõem de alternativas suficientes para entretenimento em locais públicos e precisam expor a hipocrisia das elites, de modo que estão sendo estimulados a causar impacto em ambientes frequentados por pessoas mais afortunadas.

 

Sim, uma matéria interessantíssima, que traz a visão dinâmica de um sociólogo, sobre estratificação social, estereótipo de perversão, medo social, etc., uma declaração de uma pessoa identificada como "Maria Combativa", suposta mentora local da manifestação, dizendo se contra atos de vandalismo, e  até um esboço histórico sobre a origem dos shoppings centers.

 

O que parece mais uma novidade no processo de inclusão social, no entanto, tem um lado sombrio que talvez alguns não estejam percebendo.

 

Lembro que durante a gestão do Dr. Fabio Trad, na OAB, estávamos à frente da comissão de Infância quando um Juiz da Comarca de Ilha Solteira decretou TOQUE DE RECOLHER na Cidade, ante a percepção de que uma legião de adolescentes estava sendo vandalizada, descontroladamente, noite após noite.

 

No ensejo houve uma campanha pública contra a medida e a OAB foi instada a se manifestar, quando uniformizamos a opinião institucional de que o Poder Público tinha sim o dever (e não apenas a faculdade) de restringir temporariamente o direito fundamental (de ir e vir) daqueles adolescentes em situações concretas de violação a outros direitos fundamentais, como o direito à saúde e segurança, ao desenvolvimento saudável, etc. Deveriam sair imediatamente da situação de risco como única forma de ser garantida sua própria proteção social.

 

Funcionou, com relação ao risco específico. A ordem pública parece ter sido recobrada, na Comarca.

 

O interessante (recordo me) é que no pronunciamento da OABMS salientamos ser absolutamente natural a agressividade juvenil, assim como absolutamente necessário que os Poderes Públicos disponibilizem alternativas saudáveis de canalização dessa agressividade, como centros de esporte e lazer, viabilização de acesso a ferramentas de desenvolvimento cultural e intelectual, etc.

 

Hoje, entretanto, deparamo nos com uma sociedade completamente transformada. Naquela época não tinham sido popularizados os smart phones com acesso às redes sociais, pra se ter uma ideia do quanto o mundo mudou nos últimos cinco anos.

 

E nos últimos tempos temos assistido a manifestações sociais, organizadas on line, com a mesma velocidade e abrangência das próprias mensagens eletrônicas.

 

Uma primeira onda dessas manifestações gerou controvérsia, no ano passado. Muitos gestores públicos tentaram se apropriar do movimento, aderindo  imediatamente, assumindo o microfone, e até sugerindo motivos. Outros preferiram permanecer inertes, contabilizando impactos positivos ou negativos. A maioria dos cidadãos comuns acreditou, entretanto, que tudo aquilo seria uma expressão autêntica de indignação do povo. 

 

Foi a guerra das ruas, em que legiões de jovens (sim, a maioria muito bem intencionada) desafiou o Poder Público, enfrentou as Autoridades Policiais, e alguns vandalizaram o bem Público e hoje é lembrada como uma ferramenta necessária para "acordar a população".

 

Depois veio a guerra no campo, em que populações indígenas inteiras desafiaram o domínio rural, enfrentaram proprietários rurais, ignoraram Autoridades Públicas e vandalizaram a vida e o bem particular. Polarizaram se forças políticas e houve disputa até mesmo entre entidades jurisdicionais, sobre a legitimidade dos tais desafios e enfrentamentos e a definição de direitos fundamentais cuja proteção deveria preponderar.

 

Mas assim como na guerra das ruas, apesar de parecerem manifestações espontâneas, de grupos étnicos, todos viram esgueirar se por trás dos acontecimentos lideranças não identificadas (tanto fisicamente quanto intencionalmente), deixando no ar uma dúvida persistente sobre quem está por trás da organização, realmente, e que tipo de ideal move a batalha. 

 

Nos dois casos, até hoje ninguém sabe ao certo se os grupos de pessoas expostas nas manifestações tinham consciência de suas atitudes ou são grupos hipossuficientes, vulneráveis, manobrados inescrupulosamente por quem tem interesse puro e simples em promover GUERRA SOCIAL.

 

Mas agora vemos que aquela guerra saiu da rua, passeou pelo campo e chegou no shopping.

 

Legiões de jovens pobres estão sendo conduzidas ao interior dos shoppings centers, parecendo não terem qualquer discernimento sobre as extensões sociais da própria conduta, muito menos compromisso intelectual com o propósito declarado de causar impacto negativo no ambiente comercial.

 

Todos sabem que a aglomeração em si já é capaz de afugentar os clientes dos shoppings, ao transmitir o temor razoável de arrastões delitivos, semelhantes aos que se costuma ver nas praias. O impacto existe, mesmo, e é necessariamente negativo.

 

E aqui parece surgir o limite do discurso antielitista. É óbvio que esses jovens devem ser aceitos no ambiente social elitizado, assim como é evidente a inércia estatal em relação ao dever de proporcionar ascensão social a todos esses jovens, assim como é natural que eles desejem essa ascensão.

 

É trivial o anseio que eles têm de desfilar lado a lado com os abastados filhinhos de papai, cercados de mimos, e interagir com aqueles outros jovens que muitas vezes chegam à vida adulta sem sequer conhecer o conteúdo da palavra SOLIDARIEDADE.  

 

No entanto, acredito que ninguém seja assaz ingênuo para acreditar que esses jovens todos estejam se manifestando de forma espontânea, e que tudo não passará de uma espécie de desfile cívico.

 

Há um nítido orquestramento por trás dessas manifestações, além de que as consequências da exposição vexaminosa dos jovens tende a criar um clima de revolta de proporções assombrosas.

 

É evidente que a "invasão dos shoppings" só desembocará em situações extremamente indesejáveis. Não tem qualquer utilidade positiva.

 

Assim como em bolero de ravel, há um crescente musical comum na dinâmica de todos esses casos recentes de enfrentamentos e desafios. Vemos em todos eles a implantação gradativa, no inconsciente popular, de uma cultura de desrespeito às Autoridades Públicas, desrespeito às Instituições de direito constituído e desconstrução de direitos fundamentais, como é, entre outros, o direito ao domínio patrimonial.

 

Vejam.

 

A experiência comum autoriza nos a pensar que a maioria daqueles jovens materialmente pobres, que comparecerá ao shopping no próximo domingo está apenas pensando em se divertir, com os amigos. Muitos deles aguardam tranquilamente a oportunidade da naturalmente sonhada ascensão social, trabalham, dedicam se a algum projeto familiar, por despretensioso que seja, e etc., e todos eles sonham com a oportunidade de serem aceitos no meio sócio-econômico mais avantajado que o seu.

 

E diante da emulação criada na rede social, em torno do anunciado encontro, vão certamente escolher (ou pegar emprestado) o melhor tênis, a melhor camisa, e saírem faceiros, pensando em curtir uma azaração qualquer, como se tivessem sido convidados pelo próprio estabelecimento.

 

Eles não estão infectados de ódio, até esse momento. Pelo contrário. É possível que algum desses jovens tenha um parente que trabalhe no shopping e até avise que passará por lá, para vê lo.

 

Mas eles se sentirão terrivelmente frustrados ao perceberem que foram expostos a uma surpreendente situação de hostilidade. 

 

Saem inocentemente para um "rolezinho" com outros jovens de sua convivência sem saber que estão prestes a serem apresentados ao ódio, à indignação, à revolta, ao conflito, sentimentos esses que aflorarão naturalmente diante do impacto negativo que sua presença causará no local. 

 

É óbvio que sairão de lá odiando ao comerciante e sua propriedade privada, odiando o poder econômico, odiando o vizinho abastado, odiando a tudo e a todos. Seu sonho singelo de ascensão econômica dará lugar ao ódio social. 

 

Isso tudo é tão previsível quanto seja evidente que os integrantes da aglomeração não serão bem recebidos (ao contrário da hipótese de estarem desacompanhados).

 

A simples presença do "rolezinho" já será capaz de impactar negativamente a economia (apertada) de todos os lojistas, afugentando a clientela, abalando o sustento daquela funcionária que é parente do manifestante, de modo que eles não se sentirão bem recebidos no local.

 

Pelo contrário. Parecerá a eles que são odiados por serem pobres. E isso fechará o cerco, intelectualmente, para instalar o ódio em suas mentes.

 

É aqui que parece emergir o lado sombrio da palhaçada toda.

 

A diferença entre os enfrentamentos é apenas o resultado do crescente musical. A melodia continua a mesma da rua e do campo, ao demonstrar que tudo isso é manipulação de massas vulneráveis estimuladas a exporem suas vidas em conflitos inúteis, entre classes econômicas e sociais.

 

E o resultado dessa orquestração é a transformação de jovens inocentes, pacíficos e felizes em elementos hostis, odiosos, revoltados, dispostos a manifestações cada vez mais agressivas e violentas, mesmo sem saberem a quem estão servindo. Trata se de um laboratório de guerrilha urbana, indisfarçado.

 

Alguns devem estar imaginando qual será o próximo instrumento, a ser acrescentado na melodia. Será que vão invadir bairros, prédios e casas residenciais, para demonstrar "espontaneamente" a indignação contra o poder econômico?.

 

Só os líderes da guerra social sabem afirmar, ao certo.

 

Mas quem são eles? Quem está por trás dessa indústria degenerativa? Quem tem interesse na tragédia social? Quem são esses fantasmas (que se apresentam com nomes fictícios) na liderança do caos? Eles estão a serviço de quem? Até quando agirão impunemente, à vista de todas as Autoridades? Quem se encorajará a tomar atitudes ativas contra essa empreita de esculhambação pública, como aquele Juiz de Ilha Solteira?

 

Uma certeza possível é que o gran finale do crescente musical será a ação armada, desses mesmos jovens e cada vez mais sangue derramado nas ruas. A história já demonstrou várias vezes essa dinâmica e ela criando uma aspiral de ciclos cada vez mais agressivos. Além do cidadão comum ser refém permanente de toda a bandalheira criminal dos dias atuais, ainda percebemos ideólogos do caos infiltrados no Poder Público, dedicando se à CONTRSUÇÃO DO ÓDIO SOCIAL a pretexto de inclusão.

 

É óbvio que a pobreza é um problema social crônico. Mas o estímulo crescente ao conflito, entre classes, soluciona o primeiro problema? Eu não acredito nisso.

 

Nossos jovens, hoje estimulados a odiar o semelhante gratuitamente, por gestores públicos que deveriam estar se dedicando a proporcionar lhes (aos mesmos jovens) consistentes alternativas de desenvolvimento pacífico e saudável, tendem a tornar se adultos revoltados, cada vez mais agressivos em relação ao semelhante. Soldados facilmente manipuláveis, nobolero de ravel do terrorismo social.

 

E, como convém a quem expõe uma despretensiosa preocupação pública, deixo que esse texto fique abruptamente interrompido, justamente para que seja confrontado, complementado, julgado.

 

Que Deus nos ajude.

 

Abraço.

 

Afrânio Corrêa.