MEGA FAZENDAS GANHAM NA LARGA ESCALA
De uma sala no coração do centro empresarial paulistano, Arlindo Moura, 64, comanda 290 mil hectares de soja, milho e algodão plantados em Minas, Mato Grosso, Goiás, Bahia e Piauí -a área equivale a quase duas vezes a cidade de São Paulo.
"Mas eu gosto mesmo é de ficar em Mato Grosso, perto do barulho das máquinas", afirma o disputado executivo do setor. Ele passa três dias por semana em Nova Mutum (MT) e outros dois na sede da empresa que preside, a Vanguarda Agro, uma "megafazenda" do século 21.
Modelo de 'megafazendas' é controverso e ameaça países africanos, diz pesquisador
Fruto da união de dois grupos familiares com tradição na agricultura --Maeda e Pivetta-- com a Brasil Ecodiesel, antiga produtora de biodiesel, a V-Agro tem ações negociadas em Bolsa, controle difuso, gestão profissionalizada e planejamento estratégico.
Por oferecer mais garantias aos credores, possui também acesso maior a recursos financeiros do que as fazendas tradicionais, permitindo-a investir em estudos hidrológicos, de análise de solo e no desenvolvimento de pessoas.
O maior benefício, porém, é o da escala. "Para formar uma boa margem, é preciso comprar bem os insumos e vender bem a commodity. Com maior poder de barganha, você faz melhor as duas coisas", afirma Moura.
A V-Agro adota "o novo padrão de exploração agropecuária", como define o pesquisador Mauro de Rezende Lopes, da Fundação Getulio Vargas. Em estudo sobre o tema, Lopes mapeou 17 grupos nacionais e estrangeiros com o mesmo modelo da V-Agro.
Juntos, têm meta de exploração de 3 milhões de hectares --o equivalente a um terço do território de Portugal.
A onda de investimentos ganhou força a partir de 2000, com a alta das commodities, principalmente na nova fronteira agrícola brasileira, área conhecida como Mapitoba (Maranhão, Piauí, Tocantins e Bahia), onde o plantio de soja cresceu mais de 100% na última década.
EMPURRÃO
A expansão da produção agrícola para o Cerrado, onde a terra é menos fértil e as dificuldades logísticas são maiores, estimulou esse novo modelo de negócios.
"Nas regiões onde há espaço para crescer é preciso ter ganho de escala e uso de alta tecnologia. No final das contas, isso é o que faz a diferença", afirma Aurélio Pavinato, presidente da SLC Agrícola, outra empresa que começou familiar e hoje segue rigorosos padrões de governança corporativa.
A maior necessidade de investimento está no Cerrado. Lá, é preciso "fazer o solo", no jargão do setor, o que significa promover consecutivas aplicações de nutrientes para melhorar a fertilidade. Para que os padrões da nova fronteira agrícola se assemelhem ao solo do Sul do país, demora cerca de cinco anos.
"A frase 'em se plantando, no Brasil, tudo dá' é lenda. Temos sol, mas o solo é pouco fértil em relação ao dos EUA e da Argentina. Precisamos investir na terra", diz Julio Piza, presidente da BrasilAgro, que atua no desenvolvimento de áreas agrícolas.
Apesar do baixo valor agregado dos produtos vendidos, esse modelo de negócios proporciona boas margens de lucro. Segundo Lopes, da FGV, uma taxa de retorno de 12% é o mínimo exigido pelos investidores nessas empresas --que vão desde pessoas físicas que operam na Bolsa até fundos internacionais.
DESVANTAGENS
Além do lucro na operação, as empresas ganham com a valorização da terra. Segundo a Informa Economics FNP, o preço da terra de alta produtividade em Uruçuí (PI), uma das principais áreas do Mapitoba, subiu 256% de 2003 a 2013.
"Quanto mais elevado o preço da terra, mais difícil para o médio produtor encontrar área para produzir. Para o pequeno, nem se fala. O mercado acabou dando preferência a empresas maiores."
A mesma lógica vale para os arrendamentos --modelo bastante adotado pelos grandes investidores, que optam por não imobilizar grande parte do dinheiro em terra.
Por serem maiores, as novas empresas do agronegócio conseguem negociar melhor o valor do aluguel das terras, além de obter a preferência dos proprietários por apresentarem menor risco.
O baixo nível de utilização da mão de obra local pelas "megafazendas" é visto como desvantagem. "Eles levam tudo", diz o pesquisador, que destaca também as dificuldades encontradas pelos grupos em encontrar profissionais mais qualificados.
Mas o pesquisador não acredita que esse modelo possa elevar o preço dos alimentos. Mesmo se as "megafazendas" atingirem a meta de exploração de 3 milhões de hectares, elas representarão 5% da área atualmente destinada à produção de grãos.
"Elas são uma parcela pequena. Há milhares de produtores de soja no Brasil."
FONTE: UOL/FOLHA - TATIANA FREITAS de SP