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/ MEIO AMBIENTE
Por dentro da APA Guariroba, produtores conciliam a criação de gado com ações que garantem água limpa para a população de Campo Grande

No coração da Área de Proteção Ambiental (APA) dos Mananciais do Córrego Guariroba, responsável por cerca de 35% da água que abastece Campo Grande, a Fazenda Paraíso é um exemplo concreto de que é possível produzir e conservar ao mesmo tempo. Com mais de 30 anos de história, a propriedade, conduzida pela família de Victor Luiz Aquino Barbosa, tem a pecuária de corte como atividade principal, mas se destaca também como produtora de um bem essencial à vida urbana: a água.
 

Com área total de 325 hectares, a fazenda conta com 220 hectares de pastagens, 70 hectares de reserva legal e 23 hectares de Áreas de Preservação Permanente (APPs). “Estou na fazenda desde que nasci. São quase 29 anos vivendo e acompanhando todos os manejos junto com meu pai, minha tia e nosso funcionário fixo”, conta Victor. O desafio da propriedade vai além do solo arenoso típico da região. A exigência legal para preservar Áreas de Preservação Permanente (APPs), nascentes e cursos d’água transformou o dia a dia da produção, exigindo investimento constante e adequações rigorosas.

 


 

Nos últimos anos, a Fazenda Paraíso cercou todas as áreas úmidas com um raio de 50 metros, independente da largura do rio. Foram plantadas 15 mil mudas nativas, instaladas bombas solares para captação de água e instalados bebedouros com investimentos em tubos, conexões e demais itens hidráulicos para evitar a dessedentação do gado no rio e mananciais que cortam a propriedade. Além disso, a propriedade passou por terraceamento completo, retirou outorgas para uso da água e regularizou sua documentação ambiental. “É um trabalho que exige dedicação e custo. Um animal dentro da área de APP já é motivo de multa. A fiscalização aqui é intensa”, explica.
 

Apesar de ser uma exigência legal, a família participou por cinco anos do Programa de Pagamento por Serviços Ambientais (PSA), recebendo valores que ajudaram a ressarcir parte dos investimentos realizados. No entanto, o pagamento foi interrompido em 2023 e até agora não há previsão de retomada, mesmo com a manutenção das benfeitorias sendo constante.
 

O esforço trouxe resultados não só para a propriedade, mas para todo o sistema hídrico da região. “Notamos aumento no volume de água ao final do rio e uma maior presença de fauna silvestre. As áreas preservadas ajudaram muito nesse equilíbrio ambiental”, relata Victor. “A qualidade da água se manteve boa, e o solo também”.
 

A Fazenda Paraíso é acompanhada pela ARCP (Associação de Recuperação e Conservação da Bacia do Guariroba), que presta suporte técnico e ajuda na definição dos manejos permitidos, garantindo que a produção continue em harmonia com o meio ambiente, hoje presidida pelo produtor rural, Claudinei Menezes Pecois.
 

O Sindicato Rural de Campo Grande, que integra o Conselho Gestor da APA Guariroba com os representantes Caio Banyasz Coelho e José Eduardo Duenhas Monreal, defende que produtores como Victor sejam reconhecidos como produtores de água. “Preservar não é gratuito. Exige investimento e responsabilidade. É preciso valorizar quem garante água de qualidade para a cidade”, afirma o presidente do SRCG, Eduardo Monreal.
 

Para Victor, o reconhecimento como produtor de água é um desejo legítimo. “A gente não teve escolha de entrar no projeto. Cumprimos a lei, nos adequamos, fizemos tudo certo. Hoje, fornecemos mais água para Campo Grande. Quero que isso seja reconhecido e que programas como o PSA voltem para apoiar quem faz a sua parte.”
 

Na bacia do Guariroba, a Fazenda Paraíso mostra que produtividade e sustentabilidade podem, sim, caminhar juntas — desde que haja respeito à terra, apoio técnico e políticas públicas justas.